Criada em 2014, a casa de shows A Autêntica rapidamente se tornou referência em Belo Horizonte. Com a proposta de ser voltada para a divulgação da música autoral made in Belo Horizonte e que está de passagem por ela, a casa se transformou em um pólo de difusão cultural, produção musical e até mesmo formação de novos artistas, através de projetos como as Sessões Autênticas, que abre o palco para novatos apresentarem seus trabalhos.
Então, veio a pandemia e, com ela, as incertezas. A Autêntica precisou não só fechar em função da epidemia do coronavirus, mas deixar a casa que ocupava, na Savassi. Em 2021, depois de intensa negociação, iniciou a mudança para o bairro Santa Efigenia, ocupando um imóvel histórico da cidade, não somente por sua idade, mas por sua vocação: lá funcionou, durante muitos anos o Lapa Multishow, que marcou época na cena musical da cidade.
Agora, um ano depois de sua reinauguração, a Autêntica é um case de sucesso. Nem mesmo os antigos sócios (Leo Moraes, Bernardo Dias e Sérgio Lopes) imaginavam que a casa estaria experimentando este período de prosperidade, com a maioria dos eventos cheios de pessoas ávidas por boa música. Estaria a Autêntica finalmente deitada em berço esplêndido? Ou as dificuldades do dia-a-dia ainda se sobressaem?
Neste primeiro entrevistão de PHONO, Leo Moraes, um dos sócios da Autêntica, fala abertamente sobre o primeiro ano da nova casa, os desafios, os momentos de glória, os perrengues e, de quebra, ainda dá uma aula de empreendedorismo cultural na cena belorizontina.
PHONO: Fazendo um retrospecto e olhando pra trás, como você vê o que aconteceu nesse ano?
LEO MORAES: A gente brinca que a casa antiga foi uma faculdade que a gente fez para aprender a fazer isso aqui, porque lá a gente começou na ingenuidade. A gente já tinha produzido festival, que é uma coisa pontual, mas não tínhamos idéia de como é essa coisa de lidar com o público no dia-a-dia, venda de produto e fornecedor. Não sabíamos o trabalho que dava. Eu brinco que a gente entendeu porque ninguém mais estava trabalhando com música autoral. Então o início foi muito turbulento. E aí, quando a gente estava aprendendo, veio a pandemia. E aconteceu uma série de coisas. Em primeiro lugar, o imóvel, (N. da R.: o proprietário da casa onde funcionava a primeira versão da Autêntica pediu o imóvel de volta) foi aquela loucura toda. A gente estava quebrado, devendo, não tínhamos dinheiro nenhum pra investir, então a maneira como a coisa se encaminhou pra gente vir pra cá foi muito louco.
Eu sou bem cético e não acredito em destino, mas até eu balancei porque foi muita coisinha que aconteceu na ordem certa pra isso aqui virar uma realidade. A gente sabia que para subir de degrau em termos de tamanho, algumas mudanças no funcionamento seriam necessárias. A gente ia precisar trazer alguns artistas maiores que não cabiam lá na outra casa. A grande preocupação nossa era não se distanciar da cena local que a gente sempre entendeu que era o nosso diferencial. Então a gente se esforça muito pra manter isso. A criação do Baixo Mezanino (N. da R.: projeto onde artistas da cena se apresentam em um formato pocket, para 200 pessoas) é uma iniciativa pra suprir isso e vamos voltar com as Sessões Autênticas (N. da R.: projeto da Autêntica destinado a descobrir novos talentos da cena mineira), que é pra manter isso. A gente não quer perder esse esse pé na cena da cidade. Foi um cuidado que a gente teve, mas é uma experiência muito louca.
No dia da reinauguração, aqui neste local onde funcionou o Lapa Multishow, várias pessoas que não conheciam o Lapa, pessoas que eram jovens demais pra ter vivido lá, entraram aqui, viram a estrutura, com o bar aqui do lado, o palco ali e tal, e comentaram que parecia a Autêntica antiga mas maior. Eu respondia que quando fiz o projeto da Autêntica eu tinha o Lapa como referência e queria fazer um mini-Lapa (risos). Então a gente ter vindo justo pra cá, da forma como foi, é um ciclo se fechando e se reiniciando, de voltar pra casa.
PHONO: O que muda quando se sai de uma casa com capacidade de 400 pessoas para esta, que cabem 1200. A operação é muito diferente?
LEO: Muda tudo. A operação é completamente diferente. Foi um desafio pra gente. Hoje a gente fatura em um mês o que a gente faturava em um ano da outra Autêntica. É muito discrepante. Eu encontrei outro dia com o Mancha lá em São Paulo. Ele está trabalhando no Cine Joia, que é uma casa irmã nossa, e trocamos muitas figurinhas sobre isso. O Mancha ajudou muito a gente no início porque ele tinha experiência lá da Casa do Mancha e agora ele tá lá e a gente tá aqui. E aí, perguntei a ele como estavam as coisas por lá, ele disse que nós dois tínhamos crescido. Eu respondi dizendo que antes a gente ficava no zero a zero com pouca grana, agora a gente fica no zero a zero com muita grana (risos). O faturamento sobe mas os custos também sobem.
PHONO: A Autêntica é hoje um case de sucesso. Os shows estão quase todos cheios. A que você credita esse sucesso? Ao interesse do publico crescente pós-pandemia? À cena atual da música autoral brasileira? À expertise de vocês?
LEO: Eu acho que é tudo isso junto. E nos surpreendeu muito. Nós temos um grupo de casas de shows, e durante a pandemia ficávamos chorando as pitangas, sem saber o que fazer. Todo mundo quebrado, todo mundo desesperado, várias casas fazendo um movimento de ir pra espaços menores e nós estávamos indo na contramão. Tinha uma conversa de que depois da pandemia o formato seria híbrido e as pessoas iam ficar em casa assistindo aos shows porque a live veio pra ficar. A frase que está aqui na parede da Autêntica: "A vida é ao vivo", veio de uma conversa com a Letícia, dona da casa Lab 96, em Uberaba, que falava: "De jeito nenhum! Nunca vamos fazer uma live aqui!" E eu falava: "Concordo! A vida é ao vivo!" Então, a gente começou a já usar essa hashtag no meio da pandemia. As casas de shows estavam sofrendo, era difícil tirar as pessoas de casa pra ouvir música, mas isso mudou. As pessoas sentiram tanta falta dessa coisa do encontro, de estarem juntas, que ninguém mais quis ver live. Acabou a pandemia e todo mundo desligou o YouTube.
PHONO: Com um ano, já dá pra planejar o futuro? Como está planejado esse futuro da Autêntica?
LEO: Tem várias janelas se abrindo, de iniciativas até pra fora da casa. A gente vai começar a fazer outros eventos e outras ações não presas a esse espaço físico. Isso foi uma das coisas que durante a pandemia a gente também se questionou muito. Por que a gente faz a Autêntica? Porque é uma vontade de fomentar a cena musical da cidade, dar um espaço pros artistas novos conseguirem mostrar seu trabalho e isso não necessariamente precisa ser uma casa de show. Pode ser várias coisas. Então, a gente já vinha com algumas ideias da pandemia que agora, depois de um ano, estamos começando a colocar em prática porque a poeira desta loucura de primeiro ano está abaixando.
Quando você faz um plano de negócio, é impressionante como nada acontece como o seu plano original (risos). Várias pessoas que conversavam comigo quando a gente falou que íamos voltar pra onde é o Lapa, falaram "Nossa, que legal!", mas no fundo queriam dizer: "Nossa, esses caras são loucos!" (risos). Mas é engraçado, né? À vezes tem uma coisa do sentimento de acreditar. É contramão, mas vai dar. Os sócios, nos piores momentos, se davam muita força. Teve momentos de nós três - éramos três no início da pandemia mas abrimos pra mais três, depois, pra conseguir viabilizar este novo espaço - lá no início, no auge da pandemia, chegarmos a pensar que não daria mais, mas sempre tinha um que falava que não era assim que a Autêntica ia terminar. A Autêntica só iria fechar no dia que a gente quisesse que fechasse e a gente iria fazer um mês de despedida. Íamos fechar felizes de ter cumprido a missão. Não ia ser uma pandemia que ia acabar com a gente. Então a gente tinha muito esse esse espírito de um puxar o outro.
E a questão dos três sócios veio na hora certa e foi um fator impulsionador. Passamos a pandemia inteira procurando um investidor parceiro, gente que pudesse por uma grana, porque a gente não tinha nada além da marca Autêntica e a vontade de fazer. Conversamos com um monte de gente, com amigos, com inimigos (risos), gente tudo a ver e gente nada a ver. Tinha reunião que eu fazia torcendo para aquela pessoa não topar (risos)! E aí foi um salto de fé.
Vou contar rapidinho como aconteceu: a gente já tinha negociado um valor de aluguel pra esse espaço, só que a gente tinha zero reais e não tinha condições de assumir um aluguel no meio da pandemia sem saber quando ia abrir e e muito menos fazer a reforma que era necessária, porque o telhado estava condenado e existiam outras questões relacionadas ao imóvel antigo. E nessas reviravoltas, o cara da imobiliária nos procurou e disse que queria muito alugar o imóvel pra gente, que tinha gostado da nossa proposta e perguntou o que precisava pra fechar o negócio naquele dia. O cara me chamou lá no no escritório dele no meio da pandemia, de máscara e tal. Eu falei que precisava de um ano de carência. E ele topou. Na mesma hora eu liguei pros caras e falei que tínhamos um ano pra levantar a grana e fazer acontecer.
Naquele mesmo dia a gente fez um grupo de Whatsapp e chamamos algumas pessoas que acompanhavam A Autêntica no dia-a-dia. Eu fiz um video na porta aqui deste imóvel e contei a novidade, mostrando onde ia ser a nova casa. O Luiz Prestes na mesma hora mandou: "Léo, que que legal que cês tão fazendo! Num sei se cês tão precisando de um sócio, porque eu tô afim de por grana, isso faz parte do meu projeto de vida. Se vocês quiserem, eu tô dentro, se vocês não quiserem, eu ajudo do jeito que for." Conseguimos nosso primeiro sócio no dia que a gente comunicou!
Antes disso, a gente tinha conseguido um dinheiro das dobradinhas (N. da R.: campanha de crowdfunding que a Autêntica fez antes da reabertura, que dava direito a entradas para shows da casa, quando ela voltasse a funcionar), que totalizaram 60 mil reais, e isso deu pra gente começar a dar os primeiros passos. Aí o Prestes veio com uma injeção também pra gente começar uma obra, e na sequência veio o Tomás Gonzaga. Por fim, entrou o Alfredo Lanna, que chegou pra pra cuidar da cozinha e acabou virando sócio. Todos eles foram sócios muito complementares. O Alfredo cuida do bar; o Tomaz tem uma relação com empresas, questões ligadas a captações de patrocínios, conhece todos os artistas e tem experiência corporativa em São Paulo; o Prestes é baixista do Julgamento, frequentador da Autêntica, sabe tudo da cena de BH e é engenheiro! Então, essa parte de manutenção é com ele. Nosso time é assim, complementar e eu fico hoje me lembrando do tanto de sapo que a gente beijou pra encontrar os príncipes (risos). Então, voltando àquela história, eu não sou muito de acreditar em destino, mas de vez em quando, se precisar, a gente até acredita.
As casas de shows estavam sofrendo, era difícil tirar as pessoas de casa pra ouvir música, mas isso mudou. As pessoas sentiram tanta falta dessa coisa do encontro, de estarem juntas, que ninguém mais quis ver live. Acabou a pandemia e todo mundo desligou o YouTube.
PHONO: Hoje temos um movimento, não só aqui em Belo Horizonte, mas no Brasil inteiro, de festivais dedicados à música brasileira, como o Breve e o Sensacional, que misturam artistas veteranos e novatos, numa simbiose ímpar. Isso despertou o interesse de toda uma geração para a música brasileira, reverberando na Autêntica. Você acha que isso foi importante para este sucesso da nova casa?
LEO: Com certeza. Falando da cena local especificamente, a safra é bem especial. A gente tem Djonga, a gente tem Marina Sena, a gente tem Lamparina, que são artistas que romperam as montanhas, como a gente gostava de falar lá nos primórdios. E há algum tempo que isso não acontecia. Eu entendo também que o teto do mercado médio subiu um pouco. Existem artistas que não são mainstream, mas chegaram em um nível que artista médio antigamente não tinha. Por exemplo, a Liniker. Não acho que Liniker seja mainstream mas tá ali num nível topo do mercado médio.
PHONO: Letrux também.
LEO: Exatamente. Então teve esse momento de crescimento do do mercado médio, que é algo que sempre discutíamos. Dentro da sociedade, todo mundo é muito conectado com a cena em algum nível, então acaba que entre os sócios, a gente meio que alcança todo mundo. Mas existem alguns desafios acerca disso. Um deles é conseguir chegar nessa galera que tá abaixo dessa linha do midstream, que tá chegando no mercado. Tudo bem, a gente tem o Baixo Mezanino, mas eu acho que falta a gente ainda conseguir abraçar mais essa galera. Sessões Autênticas vai ser isso. A gente vive pensando em formas de dar mais oportunidade pra essa turma, como na casa antiga, que sempre tínhamos alguém local na na programação.
Sempre tentamos convencer o artista de fora que é legal ter um artista de abertura e que esse artista precisa ser local, ainda mais agora que a gente consegue pagar pelo show de abertura! Lá na Autêntica antiga a gente não conseguia. Pra gente conseguir pagar o legal o artista headliner da noite e os nossos custos, não sobrava para o artista de abertura. A gente teve várias discussões no Facebook na época sobre isso. Aqui, pelo tamanho, pelo tícket médio, pela venda do bar, a gente consegue pagar a banda de abertura. Isso já é uma evolução e a gente tá tentando fazer uma política ainda mais inclusiva nos shows de abertura.
PHONO: Uma coisa que talvez tenha ajudado foi a série de posts que você fez nas redes sociais mostrando a realidade da casa, abrindo planilhas, para que público e artistas entendessem a real situação e, principalmente, que não era possível fazer da maneira que vocês queriam.
LEO: Isso era muito louco porque eu fazia isso e aí várias bandas já iam negociar comigo com base no que eu tinha falado (risos)! A galera já chegava com essa consciência. Eu já xinguei muito dono de casa de show antes de eu ser dono de casa de show. Eu falava: "Porra o Guilardo (Veloso, antigo dono do Lapa Multishow) é jogo duro!" Aí depois eu descobri que o Guilardo é uma mãe. A gente enxergar o outro lado e entender que tá todo mundo no mesmo barco é muito importante. Essa questão de quem trabalha com música, com cultura, até vocês mesmos, que tem um veículo de imprensa pra cobrir... cara, isso não é o melhor negócio do mundo! Casa de show não é o melhor negócio do mundo! Se eu quisesse ganhar dinheiro e tal eu ia investir meu dinheiro em outra coisa. Claro que tudo tem que ser sustentável mas todo mundo tem que se entender: os artistas, o cara do festival, o cara da casa, o cara que tá abrindo o espaço, o cara que tá gastando tempo dele, o conhecimento dele pra fazer uma resenha do meu show. A gente tem que valorizar uns aos outros.
PHONO: Eu queria que você puxasse a sua memória assim e elencasse três grandes momentos deste um ano da nova casa.
LEO: Sem dúvida, um deles foi a inauguração. Eu não sei se vocês sabem, mas quem inaugurou o Lapa Multishow foi o Vander Lee com a Elza Soares. A gente tava querendo trazer a Elza pra inauguração, mas acabou que por questões logísticas e pela saúde dela, acabou não rolando. E aí a Laura Catarina, filha do Vander Lee, estava terminando de gravar um disco com as músicas do pai. Pensamos então em fazer Laura e Elza, mas como o negócio da Elza não rolou, a gente resolveu tentar o Tom Zé. Então a gente acabou escolhendo a dedo a programação, fazendo uma referência ao Lapa.
E o bom momento ainda foi potencializado porque foi o primeiro dia que a Prefeitura de BH liberou o uso de máscara. Tinham pessoas aqui dentro que não se viam há dois anos. As pessoas estavam se abraçando! Então tinha Tom Zé, Lapa, Autêntica, fim da máscara, as pessoas se encontrando pela primeira vez. Foi um marco. O Tom Zé até deu umas reclamadinhas que o povo estava conversando muito alto, mas no final ele entendeu.
Outros dois eu diria que foram os shows de Céu e Liniker. São dois artistas que a gente tentou levar lá na Autêntica antiga, mas que já não cabiam, eles já estavam no tamanho maior. Antes era areia demais pro nosso caminhãozinho, agora o nosso caminhãozinho cresceu (risos)!
O que mais? Deixa eu ver. Eu gosto muito quando amigos tocam no palco e eu chego lá pra apresentar. Alguém que cresceu com a gente e tal. Teve um caso que aconteceu recentemente, que foi o Fábio de Carvalho. Ele agora faz parte da Geração Perdida, roda o Brasil tocando, e tem muitos seguidores. Eu vi esse menino lá na Autêntica antiga, nas Sessões Autênticas. Ele subiu no palco e falou: "Essa é a primeira vez que eu vou tocar minhas músicas fora do meu quarto". E aí ver esse menino aí agora nesse palcão cheio de gente cantando as músicas, foi bem especial.
PHONO: Não só de bons momentos viveu este primeiro ano. Tem também os perrengues. Fale sobre eles e como foram os aprendizados que vocês tiveram a partir deles? Acredito que o maior deles tenha sido o show da Letrux.
LEO: Isso. Primeiro o seguinte: a ligação elétrica da casa, não por nossa culpa, mas da ligação da rua, ela é meio precária, e a gente tá esperando uma obra da CEMIG há um ano. Agora que os caras estão vindo fazer. Então, isso sempre foi uma fragilidade nossa. Trabalhamos nos primeiros meses com gerador, só que aí é aquela história: todo mês pagando 30 mil de aluguel do gerador e fechando o mês no vermelho. Pensando então em correr um risco. Aí, três semanas depois que a gente parou de pagar o gerador, aconteceu de acabar a energia no show da Letrux. Foi uma situação que a gente nunca tinha enfrentado porque acabou a luz logo depois do show de abertura. As luzes de emergência todas funcionaram, então foi bom pra ver que a estrutura de emergência da casa funcionou. Na sequência, voltou uma fase mas não era suficiente pra ligar.
A verdade é que a gente não estava preparado pra isso. Por sorte, vários de nossos sócios estávamos na casa, então a gente conseguiu coordenar um pouco dentro do caos. Tentamos conseguir gerador, ligamos para a CEMIG para eles virem consertar, mas tivemos uma falha que foi a comunicação com quem estava aqui dentro. Os próprios funcionários da casa davam informações desencontradas por não terem a informação correta.
Hoje a gente tem um procedimento de emergência - compramos rádios pra equipe toda, pra gente poder se comunicar. A gente fez várias mudanças por causa disso. A partir de agora, se errarmos de novo, que sejam erros novos, mas não vamos mais cometer os erros antigos.
O lado positivo disso tudo foi que o público se mostrou muito compreensivo. Mesmo com as cobranças e os xingamentos, se fosse um público mais exaltado poderia ter sido pior. E demos sorte da coisa não ter não ter piorado.
A Letrux lidou muito bem com a situação. Ela subiu no palco, ela cantou à capella, prometeu que que marcaria uma outra data e marcou! E fez duas datas! A gente soltou uma nota no dia seguinte assumindo todas as nossas falhas. e a Letrux falou: "Gente, eu eu tava decidida a não fazer, quando eu li a nota de vocês, eu achei tão legal que vocês assumiram que resolvi marcar." No final das contas, dentro do caos, a gente conseguiu lidar com tudo de uma forma digna.
PHONO: Você acha que falta um pouco de transparência nestas relações e, quando isso existe, as pessoas olham para a casa de uma outra forma?
LEO: Sim, e, com certeza, este foi o maior aprendizado não só do ano, mas da história da Autêntica, em seus oito anos de existência. Nunca tínhamos passado por uma situação tão crítica. A gente teve lá na Autêntica antiga um dia que também estourou um transformador no final do show do Jaloo, e lá não tinha gerador porque não tínhamos condições de pagar. Mas ele estava no bis, na última música, acabou ali e foi mais tranquilo. E teve um outro dia num evento menor, em termos de público, que era até da turma da Balaclava. Olha as coincidências da vida: nesse dia acabou a luz no meio do evento, não tinha muito público e a última banda não tocou. E um dos caras dessa banda era o tecladista da Letrux! As duas vezes que ele veio na Autêntica na vida acabou a energia. Eu até brinquei com ele: a culpa é sua! (risos)
PHONO: Fale pra gente sobre as comemorações deste primeiro ano de funcionamento da casa.
LEO: A gente queria ter tido o Djonga na primeira semana da casa, mas acabou não rolando na época. Agora conseguimos. Ele já fez algumas participações aqui, como no show do FBC mas nunca um show dele solo. A gente queria muito o Djonga pela coisa de ser o maior artista de Minas da atualidade e ele está aqui literalmente debaixo da casa dele.
Sempre tentamos dialogar com esse público lá na antiga casa, na Savassi. Fizemos alguns eventos, com o pessoal do Lá Da Favelinha, como o Disputa Nervosa, sempre na tentativa de democratizar cada vez mais o acesso à Autêntica. Achávamos que vindo pra zona leste ia facilitar e de fato isso aconteceu. A gente tá tendo eventos muito mais diversos aqui e essa coisa do Djonga é muito simbólica. E junto com o Douglas Din que já até trabalhou na Autêntica, como designer! Dois artistas da cidade no dia do aniversário.
Também temos nessa semana de aniversário o Angra, pra reforçar a diversidade da casa, e a Tulipa Ruiz. A gente montou assim, com diversidade, pra mostrar que isso é a Autêntica. Na outra casa, a gente fez a inauguração com o Billy Cobham e no dia seguinte foi a Lupe de Lupe lançando o Quarup, que era uma banda também do underground da cidade. Então assim, a gente pegou o cara do jazz lá, que tocou com Miles Davis, num dia, e no dia seguinte a banda da cidade.
Desta vez, a gente acabou não pensando a programação da mesma forma porque foi uma coisa de oportunidades. O Djonga a gente já vinha conversando e a gente juntou com a Tulipa, que já esteve em dois aniversários da Autêntica antiga....e aí calhou de ela estar na cidade no mesmo fim de semana deste aniversário.
PHONO: A procura dos artistas que querem vir tocar em Belo Horizonte tem sido maior? Você acha que a Autêntica já é uma referência deste tipo?
LEO: Com certeza. Aconteceu um movimento parecido com o que aconteceu na casa antiga. No início a gente ficava correndo atrás dos artistas pra tocar lá. Depois que alguns artistas começaram a passar por lá e ver que era legal, a gente começou a ter o caminho contrário. Eu lembro que o Marcelo Jeneci foi um que a gente tentou trazer lá. Ele mandou um cachê que não dava pra pagar e aí passou sei lá, seis meses, e ele voltou querendo fazer. Mas dentro da nossa realidade. Aqui tá acontecendo uma coisa semelhante. Claro que aqui a gente já trouxe o nome de lá e muita gente já tinha tocado lá, mas quando chegou aqui, viu que é outro lugar, outra estrutura, outro tudo.
PHONO: Aproveita e responde àquela pergunta: como é que eu faço pra minha banda tocar na Autêntica? (risos)
LEO: (risos) Isso é uma dificuldade, porque a gente recebe muito, muito, muito email, muito material, muito zap, às vezes de pessoas próximas, e eu fico até sem graça porque muitas vezes a gente não consegue nem responder. A gente tá formatando um modelo de formulário pra organizar isso e conseguir dar mais atenção uma forma mais metódica. Às vezes o cara me mandou o material seis meses atrás, eu não consegui nem ver, aí alguém que ligou ontem, mas caiu no dia certo, acaba entrando. E isso gera frustração. Eu tenho hoje uma casa muito maior, e temos pouca margem pra fazer evento deficitário. Lá na outra a gente conseguia, mas aqui um evento deficitário é uma catástrofe.
A gente tá produzindo música aqui. Quer dizer, a lista de artistas que querem tocar na Autêntica é quase um retrato da cena. Todo mundo hoje quer tocar na Autêntica. E com o tempo, de uma forma ou de outra, todo mundo vai.
SERVIÇO
A Autêntica fica na Av. Álvares Maciel 312 - Santa Efigênia - Belo Horizonte - MG
Programação e ingressos: www.aautentica.com.br
Instagram: @autentica.bh