Foto: Pablo Bernardo
Richard Neves é um musicista natural de Tiradentes (MG) e está radicado em Belo Horizonte desde 2010. A partir daí, o artista tem realizados trabalhos ao lado de artistas diversos do cenário nacional como como Milton Nascimento, Ivete Sangalo, Samuel Rosa, Paula Lima, Ney Matogrosso, Sérgio Pererê, Maurício Tizumba, Pedro Morais e Raquel Coutinho. Atualmente, além de atuar como produtor, Richard é tecladista da banda mineira Pato Fu desde o ano de 2016.
Após mais de duas décadas de estrada e com carreira consolidada, o artista multifacetado lançou em maio seu primeiro álbum solo. O álbum O Mergulho conta com sete faixas instrumentais que dialogam percussões e sintetizadores, transitando por diversos gêneros, referências e timbres. Reunindo um time diversificado de convidados, no disco conta com a colaboração de John Ulhoa (Pato Fu), Marcos Suzano, Paulo Santos, Chico Amaral, Julia Tizumba, Sérgio Pererê, Célia Xacriabá que contribuem diretamente para o belo resultado final.
Em entrevista concedida ao Phono, Richard fala sobre suas origens musicais e referências, o processo de composição e gravação do novo disco, sua entrada na banda Pato Fu, parcerias com outros artistas, as diferenças e semelhanças entre atuar como musicista e produtor, planos futuros e muito mais!
Phono: Richard primeiramente gostaria de agradecer o seu tempo e disponibilidade para nossa conversa. Como de hábito gosto de iniciar as entrevistas abordando as origens musicais de cada artista. Nesse sentido, como se deu a sua relação com o universo da música e quando você percebeu que ela seria duradoura?
Olá, Bruno! Eu é que agradeço pelo contato e pelo interesse no meu trabalho. Obrigado!
Música foi uma coisa que começou em casa. Muito por influência do meu pai, que não era músico, mas que gostava de música. O leque dele era amplo e ia de Brahms até Tonico e Tinoco. Eu gostava de quase tudo o que ouvia em casa. E até eu hoje gosto de ouvir muita coisa diferente também. Penso e sinto que é uma fundamental pra quem, assim como eu, pretende ser um produtor musical.
Também tenho alguns primos mais velhos que tocam, alguns deles o fazem profissionalmente até hoje. E por parte da família da minha mãe, tinha o meu avô que era da Folia de Reis e construía instrumentos.
Sobre a carreira ser duradoura, acho que percebi quando comecei a tocar na minha primeira banda em Tiradentes. Banda que eu tinha com o meu irmão e alguns amigos. O “bichinho da música” me mordeu ali mesmo. Rs!
Phono: Sua carreira multifacetada é também associada a atuação ao lado de artistas diversos como Paula Lima, Ney Matogrosso, Milton Nascimento, Samuel Rosa, Ivete Sangalo, entre outros. Como se deu essa abertura e quais são os maiores desafios de se performar em tão amplo arco de facetas musicais?
Sim. Isso pra mim é uma alegria imensa. Essas portas foram se abrindo depois da minha vinda pra Belo Horizonte, que foi por volta de 2008. Os próprios trabalhos, vivências, amigos e amigas foram contribuindo para que eu pudesse acessar esses e essas artistas. Tem momentos que ainda acho “estranho”, ter trabalhado com tanta gente que admiro muito. Mas tem sido assim e sou grato por isso.
Acho, sinceramente, que não existe tanta diferença em se trabalhar com artistas renomados e artistas não muito conhecidos. Todo trabalho exige respeito, escuta e dedicação. Se tiver “ticado” essa listinha já dá pra acessar muitas portas.
Phono: Para além dos teclados você também atua como produtor. Acredito que ambas as funções tenham conexão direta, mas quais são as diferenças e semelhanças de se atuar em ambas as frentes?
Ser tecladista pode ajudar a muito a ser um produtor musical, ainda mais nos dias de hoje, em que se busca reduzir muito a quantidade de equipamentos para se produzir um single, EP ou álbum, mas não está garantido que “se você for um tecladista, serás um produtor”. Conheço produtores incríveis que não são tecladistas e também tecladistas incríveis que não são produtores. Eu, de minha parte, tenho interesse pelas duas coisas – teclados e produção musical. O mais bacana, pra mim, é que a produção musical me empurra para outros instrumentos, que – como entusiasta de outros timbres e sonoridades – gosto muito de ter que buscar uma camada bacana pra uma música, uma trilha, uma abertura da faixa, enfim. E isso, certamente, pode estar em algum outro instrumento. Esse interesse por buscar esses elementos me nutrem bastante nesse campo fértil que é a música.
Phono: Seu trabalho ganhou maior exposição a partir do momento em que você se tornou integrante do Pato Fu desde 2016. Visivelmente a sua entrada foi um grande ganho para a banda, pois fez com que a rica sonoridade do grupo ganhasse ainda mais camadas. Como se deu a aproximação entre vocês e como tem sido o processo criativo ao lado deles?
A minha entrada pro Pato Fu é o acontecimento mais bacana da minha carreira musical. Acredito que tenho contribuído no que posso com a sonoridade da banda, que veio de muitos anos de trabalho primeiramente sem tecladista e depois com o Lulu Camargo, que é um músico imenso. Isso aumenta minha responsabilidade – ou seja, ocupar a cadeira que foi do Lulu e estar numa banda tão inventiva e premiada como o Pato Fu.
A aproximação se deu através do Koctus e do Glauco Mendes (que foi baterista do Pato Fu durante um período). Fizemos alguns trabalhos juntos e ficamos amigos rapidamente. Quando o Lulu saiu da banda o Koctus me indicou pra ser o novo tecladista. Aí o John e a Fernanda acharam legal. A gente já se esbarrava por causa da Erika Machado, amiga querida e cantora de BH que o John produziu quase todos os álbuns e com quem tive a alegria de trabalhar por uns anos.
Processo criativo é sempre bacana! O John além de um super produtor é um cara muito generoso. Te deixa sugerir. Escuta o que você tem a propor. Muitas vezes peço até pra gravar em casa, pra aumentar a possibilidade de timbres e tal. E é sempre uma coisa leve. Desapegada. Porque tem de ser bom pra música. E muitas vezes a gente tem uma impressão de que vai gravar e acertar tudo (risos). Nem sempre é assim.
Foto / Capa: Pedro David
Phono: Adentrando ao universo de O Mergulho, este é o seu primeiro álbum e, de imediato, percebesse que o disco é uma verdadeira imersão (com o perdão do trocadilho) em ritmos e sons que convidam ao ouvinte a uma audição mais atenta. Nesse sentido, como foi o processo de composição e gravação do disco?
Sim. O Mergulho é uma provocação a mim mesmo. Eu que em mais de 20 anos de carreira (acho que são 25), dediquei minha trajetória quase toda à música pop e às canções, de repente pensei em fazer um disco de música instrumental, que em alguns momentos flerta com o experimentalismo.
As composições foram acontecendo. Fluindo. E as gravações foram quase todas no meu Home Studio – Salamandra, Estúdio em Casa. O que norteou o disco foram os sintetizadores e as percussões. Dois temas que também me interessam. Quando dei por mim já tinha um disco. E as percussões passavam pela cultura afro-latina. Gostei disso! Muito! Rs! Os timbres dos sintetizazdores levaram tempo, pois gosto de investir o tempo nisso. Daí surgiu o disco. Cheio de participações bacanas e até mesmo um show de lançamento em Maio de 2024, com uma formação interessante - dois percussionistas (Débora Costa e Acauã Rane) e dois tecladistas (Eu e o Marcus Nogueira).
Phono: No álbum você conta com a participação de um grupo seleto de convidados como John Ulhoa, Marcos Suzano, Paulo Santos, Chico Amaral, Julia Tizumba, Sérgio Pererê, Célia Xacriabá que contribuem diretamente para o resultado final. Como se deu a seleção dos mesmos e quais as contribuições eles trouxeram para o álbum?
Sim! Muita gente grande, né? (risos) Bem, eu já tinha esse desejo de convidar algumas pessoas para participarem. Algumas eu já sabia em quais músicas. Outras não. E isso seria definido pela questão timbrística, novamente. Se me parecia que era guitarra, ou percussão, ou flauta, ou voz, enfim, o que a música pedisse, sabe?
Cada um trouxe o seu tempero. E isso vai se somando ao resultado final do disco. Que, ao meu ver, é um disco bonito. Muito embora, eu ainda mexesse em algo pra melhorar, mas mixagem precisa ser abandonada em algum momento. Pra fechar o ciclo e abrir outros.
De toda forma, ter a participação de nomes – GRANDES - que eu respeito e admiro tanto, no meu primeiro álbum é algo que me alegra muito. Bota a gente pra pensar na nossa própria trajetória profissional e, certamente, no cultivo das nossas amizades.
Phono: A música brasileira é rica nas mais variadas searas e vertentes. Acredito que em O Mergulho você tenha almejado estabelecer um diálogo
com parte da nossa tradição musical. Nesse sentido, quem foram os artistas norteadores que o guiaram para a realização do disco?
Sim. Como eu disse anteriormente a percussão afro-latina é um dos norteadores desse trabalho. No disco você vai encontrar um pouco de salsa, pop, rock, ritmos de candomblé e também do Congado. Isso tudo veio da música negra. Então, apesar de que alguns artistas que me influenciaram e influenciam, não serem negros, eles próprios foram influenciados por essa música.
Fico meio de sinuca quando falo sobre influências. É provável que eu esqueça sempre de alguém, né? Porque pra mim influências são todas as referências que têm feito parte da nossa própria história. E isso pode, inclusive, estar fora do universo da música. Mas talvez pra esse disco, se entendi bem sua pergunta, talvez eu possa falar um pouco sobre Dom Salvador, João Donato, - Martin, Medeski e Wood -, Letieres Leite, Moacir Santos, Jimmy Hendrix e alguns filmes e cineastas. Porque sinto O Mergulho como um álbum de paisagens sonoras. Acho que passa um pouco pelo que captei, entendo ou percebi no trabalho desses artistas. Mas entendo que devem haver outros nesse lugar da influência.
Phono: Por fim, com disco novo na praça quais são suas intenções futuras?
Esse disco foi viabilizado pela Lei Municipal de Incentivo à Cultura de BH. Importante mencionar esses dispositivos que viabilizam projetos culturais.
Então, em se tratando de dinheiro público, o primeiro a se fazer é, fazer uma prestação de contas correta.
Depois organizar todo material de fotos, áudio e vídeo gerados pelo projeto e aí sim circular com o show do Mergulho, que apesar de ser um show instrumental, relativamente simples - do ponto de vista de produção cultural - tem uma equipe relativamente grande, envolvendo som, luz, projeções do Qualq – que assina a direção visual do show e vizualizers disponibilizados nas minhas redes –, e também roadie e produção executiva, que nesse projeto foi feito pelo Elias Gibran, da Na Pele Produções.
Então, depois de organizado, o que o Mergulho quer é mergulhar em festivais, teatros e outros locais que possuam uma estrutura mínima pra que a gente possa apresentar esse show, que foi preparado com carinho, respeito e dedicação por mim e por todos os profissionais e as profissionais que me acompanham nesse trabalho. Enfim, O Mergulho quer é botar seu escafandro fluir os sons por aí.
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